“Então Jesus mandou o povo sentar-se em grupos na grama verde” (Mc 6,39).
Com essas palavras São Marcos destaca a atitude de Jesus diante de uma multidão faminta, motivada, é claro, por Sua grande compaixão para com as ovelhas sem pastor (cf. Mc 6,34). No contexto, os discípulos queriam despedir o povo, enquanto Jesus queria que eles alimentassem a multidão. Um choque de vontades. Mas, e o povo? O povo, sinal de todos nós, continuava passando fome.
Interessante é a questão do comer no texto. Por um lado apresenta Jesus como o Bom Pastor que dá descanso e comida (cf. Sl 23) e faz-nos lembrar a provisão de maná do deserto (cf. Ex 16). Por outro, sobretudo por causa do v. 41 pensamos no pano de fundo eucarístico dessa passagem: “Jesus… olhou para o céu e DEU GRAÇAS a Deus”.
Com esse antecedente do AT e o traço eucarístico do NT compreendemos melhor a atitude de Jesus: sentou as pessoas em grupos. Na Bíblia, sentar é postura de convidados a um banquete, enquanto a grama verde – além de aludir às verdes pastagens (cf. Sl 23,2) – nos fala de um estado de comunhão semelhante ao do casal apaixonado que se entrega mutuamente sobre a cama (cf. Ct 1,16).
Ora, em Cristo somos chamados a nos assentar no banquete do Reino e aí desfrutar de uma íntima comunhão com Ele. Essa é a mensagem que salta do texto. Ele nos traz descanso e comida, nos provê tudo que necessitamos para bem viver. Porém, o texto faz questão de frisar que esse chamado à comunhão com Cristo se expressa na comunhão com outras pessoas: “Todos se sentaram em grupos…” (Mc 6,40).
Não se trata de uma massa anônima, tampouco de uma relação com Deus individualista. Há um meio termo chamado pequeno grupo, pequena comunidade, célula. Nas reuniões semanais cada membro tem a oportunidade de saciar sua fome mais profunda de comunhão na presença de Deus e companhia de outros irmãos. Aí Deus oferece provisão, descanso em meio à jornada da vida e nos trata com dignidade, pois, “sentados na grama”, percebemos como somos iguais, limitados, dependentes uns dos outros.
Nas reuniões das células comemos não para passar tempo, mas para retomar e vivenciar uma partilha que vai além de sucos e pães, arroz e feijão. Por traz do lanche ou da janta está a comunhão. Na Igreja primitiva era assim (cf. At 2,46-7). Comer é um tema fundamental na Bíblia. O ser humano caiu no pecado pelo comer (cf. Gn 3,1s), mas pode em Cristo ser salvo pelo comer (cf. Jo 6,53-54). É por isso que São Paulo chega a dizer: “Portanto, quando vocês comem, ou bebem, ou fazem qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus” (1 Cor 10,31).
No encontro semanal de sua célula deixe que Cristo o faça sentar, deixe que Cristo, pelas mãos de outros, te alimente, deixe que Cristo faça sobrar pão em sua vida de modo a encher posteriormente o cesto de outros. Esse é grande milagre, a comunhão com Deus, a comunhão com os outros em Jesus.
Por Cesar Machado Lima